Como foi a sua primeira experiência como investigador num ensaio clínico? O que o motivou a fazer investigação?
Sou médico Oftalmologista com uma prática clínica muito intensa. Ter um conhecimento científico atualizado é importantíssimo para que os nossos doentes possam ter acesso aos melhores cuidados existentes. No entanto, deparamo-nos muitas vezes com situações para as quais não temos as respostas necessárias, ou porque não há tratamentos mais eficazes, ou porque os tratamentos existentes precisam de ser mais informação em termos de eficácia, segurança, novas indicações, novos esquemas terapêuticos ou associações ou simplesmente porque necessitamos de saber como reagem os nossos doentes aos tratamentos. Além disso, a impotência por vezes sentida, perante certas situações clinicas de difícil solução, ou mesmo sem solução, faz com que se torne importante o aparecimento de novas moléculas com maior eficácia. Foram situações como estas que me motivaram para a investigação clinica. Não aceitar que não se pode ir mais além.
A minha primeira experiência como investigador num ensaio clínico ocorreu na DMI. Um estudo multicêntrico, randomizado, com uma nova molécula, ainda na década de 90. Foi um grande desafio e a molécula não mostrou segurança nem maior eficácia em relação ao comparador, não tendo, por isso, sido aprovada para a prática clínica.
Tendo presente a sua primeira experiência como investigador num ensaio clínico, conte-nos um pouco da evolução que tem vivido ao longo dos anos, pontos positivos e eventualmente menos positivos?
Esta primeira experiência teve tudo o que têm as primeiras experiências, a começar pela falta de experiência. Mas o aspeto mais relevante foi a falta de estruturas indispensáveis à realização de investigação clínica. A ausência de uma equipa de investigação estruturada (médicos, enfermeiros, farmacêuticos, técnicos, coordenadores clínicos), tornou a experiência pouco motivadora para a realização de novos ensaios clínicos.
No entanto, ao longo dos anos foi possível criar estruturas de apoio à investigação e formar recursos humanos que permitiram que participássemos em numerosos ensaios clínicos e estudos da iniciativa do investigador. Tivemos oportunidade de participar em ensaios clínicos que estiveram na origem da introdução de novas moléculas no mercado e que vieram melhorar radicalmente o prognóstico de doenças como a DMI ou a retinopatia diabética.
Como reage um doente quando lhe propõe fazer parte de um ensaio clínico e de que forma o motiva a participar?
Quando o médico está convencido de que o doente pode beneficiar com a participação no ensaio clínico, e consegue transmitir esta mensagem, o doente reage, em regra, muito bem. A resposta do doente é na quase totalidade dos casos baseada na confiança que tem no médico. A informação dada ao doente deve sempre transmitida de uma forma acessível e completamente transparente. Aliás, os consentimentos informados que os doentes assinam são em regra exaustivos e descrevem de uma forma clara os benefícios e os riscos associados aos estudos.
Um doente de ensaio clínico é um doente diferente?
Os doentes incluídos nos ensaios clínicos devem ter os critérios de inclusão definidos no protocolo em causa. Ao serem selecionados passam a ter um acompanhamento personalizado, rigorosamente monitorizado, ao longo de todo o estudo. Podemos por isso dizer que tem um tratamento privilegiado durante o ensaio clínico.
Quais os principais problemas/dificuldades que podem dificultar a investigação clínica em Portugal? O que poderia ser feito para potenciar esta área?
São várias as dificuldades a enfrentar para se poder fazer investigação clínica. A primeira passa exatamente pela falta de tempo adjudicado à investigação. O horário dos médicos está todo coberto por consultas, bloco operatório, enfermaria. Não existe tempo para a investigação clínica. A segunda dificuldade passa pela insuficiência de estruturas de apoio à investigação clínica, nomeadamente centros de ensaios clínicos estruturados, equipados e com recursos humanos dedicados (CRO, técnicos, coordenadores clínicos, enfermeiros, farmacêuticos, gestores de projetos…). A terceira dificuldade passa pela dificuldade em encontrar financiamento para os projetos.
E o que se faz de melhor em Portugal nesta área e que poucos sabem?
Temos sido leaders em recrutamento em vários ensaios clínicos. Investigadores portugueses surgem como primeiros autores nas publicações dos resultados de vários ensaios clínicos de âmbito mundial. Fizemos o primeiro estudo epidemiológico em Portugal na DMI, que incluiu 6000 pessoas e que permitiu conhecer a prevalência real da doença em Portugal. Fizemos posteriormente o primeiro estudo da incidência e da progressão desta doença e estamos a fazer o estudo genético. Investigadores Portugueses elaboraram e coordenaram vários estudos multicêntricos, internacionais, em áreas como a DMI, a retinopatia diabética ou a Vasculopatia Polipoide. A coordenação de uma rede de centros de investigação clínica Europeia, com mais de 100 centros (EVICRnet) é feita em Coimbra….
O que poderia ser feito nesta área para desenvolver e aumentar o número de Ensaios Clínicos em Portugal?
Estruturar os serviços hospitalares de forma a criar tempo para a investigação, criar estruturas de investigação em cada hospital, devidamente organizadas, e investir em recursos humanos dedicados à investigação.
Como acha que decorrem os ensaios clínicos em Portugal comparando com outros países da Europa e do Mundo? Acha que difere de área terapêutica para área terapêutica?
Os ensaios clínicos na Oftalmologia feitos em Portugal são de grande qualidade e altamente competitivos com os outros países europeus.
Como Investigador de vários estudos e de vários promotores, pode dizer-nos, do seu ponto de vista, em que área a Novartis se destaca? Qual?
O grande envolvimento da Novartis no apoio à investigação tem sido realmente um marco diferenciador. A Novartis tem sido uma grande promotora da investigação clínica em Oftalmologia em Portugal, não só pela introdução de numerosos ensaios clínicos sponsorizados pela indústria, mas também pelo apoio a estudos da iniciativa do investigador. A prática clinica em Oftalmologia nos últimos 10 anos tem sido em grande parte moldada pelos estudos clínicos da Novartis. Estes levaram à introdução de novas moléculas, novas indicações e novos esquemas terapêuticos. O tratamento das duas doenças responsáveis pela maior incidência de cegueira – a retinopatia diabética, a degenerescência macular da idade – está certamente marcado pela investigação promovida pela Novartis.