Como foi a sua primeira experiência como investigadora num ensaio clínico? O que a motivou a fazer investigação?
Já lá vão muitos anos e as coisas eram muito diferentes do que são hoje. Havia poucos ensaios clínicos, a organização e os apoios eram muito menores e praticamente todos os procedimentos recaíam sobre os investigadores. Foi uma maneira de contactar com uma realidade distinta, com procedimentos de grande rigor e de proporcionar aos participantes acesso a fármacos inovadores.
Tendo presente a sua primeira experiência como investigadora num ensaio clínico, conte-nos um pouco da evolução que tem vivido ao longo dos anos, pontos positivos e eventualmente menos positivos?
Ao longo dos últimos 20 anos os ensaios cresceram em número e em complexidade. Os responsáveis hospitalares passaram a encarar esta realidade de forma diferente, a reconhecer nos ensaios clínicos uma oportunidade para as instituições e a apoiar de forma mais estruturada a sua realização. Hoje em dia a maioria dos médicos participa de forma regular em ensaios clínicos e, em regra, isso tem uma repercussão positiva no seu desempenho clínico. O reverso da medalha é o tempo que os ensaios clínicos consomem e a dificuldade em incorporá-los nas atividades diárias.
Como reage um doente quando lhe propõe fazer parte de um ensaio clínico e de que forma o motiva a participar?
A generalidade dos doentes tem um grande altruísmo e aceita participar. Para alguns é ainda uma forma de aceder a novas terapêuticas, não disponíveis no mercado.
Um doente de ensaio clínico é um doente diferente?
Todos são potenciais participantes, mas é claro que alguns doentes têm menor probabilidade de integrar um ensaio devido às características da sua doença, comorbilidades, medicação, etc. Em regra, os doentes mais esclarecidos e com nível de educação mais elevado entendem bem a importância dos ensaios clínicos e aceitam mais facilmente participar. No decurso do ensaio os participantes têm um contacto muito assíduo e facilitado com a equipa de investigação, são avaliados detalhadamente, com procedimentos diferentes da prática clínica habitual e isto leva a uma forte ligação com a equipa de investigação.
Quais os principais problemas/dificuldades que podem dificultar a investigação clínica em Portugal? O que poderia ser feito para potenciar esta área?
A falta de tempo e a falta de espaço. A primeira pode ser melhorada com uma re-estruturação de tarefas e tempo protegido dedicado à investigação clínica. Já em relação à segunda, a resposta é mais difícil, pois tem a ver com as estruturas e funcionamento dos hospitais.
E o que se faz de melhor em Portugal nesta área e que poucos sabem?
A performance dos centros é muito boa, assim como o cumprimento das boas práticas clínicas e dos princípios éticos na condução dos ensaios clínicos. Temos conseguido recrutar rapidamente um número bastante razoável de participantes, sobretudo em doenças raras.
O que poderia ser feito nesta área para desenvolver e aumentar o número de ensaios clínicos em Portugal?
Ter tempos protegidos para investigação e valorizar curricularmente esta vertente, sobretudo fora dos centros académicos
Quais os principais desafios que a área da investigação lhe coloca diariamente?
Organização e gestão muito criteriosa do tempo
Depois de participar num ensaio clínico em que não conseguiu incluir o número de doentes previsto, o que faria de diferente?
É fundamental analisar criticamente o protocolo, estar consciente dos desafios e particularidades do estudo e ter expectativas realistas quanto ao número de doentes a incluir. Claro que podem surgir imprevistos, mas isso deve ser a exceção.
Tem alguma sugestão que possa facilitar a sua atividade como investigadora e que seja exequível de implementar no seu centro?
Optimizar infraestruturas de apoio (secretariados, coordenadores de estudo, etc.), agilizar colaboração entre os profissionais envolvidos (farmácia, imagem, laboratório, etc.) e aumentar o espaço alocado aos ensaios clínicos.